sexta-feira, outubro 17, 2008

A “justa” e “dolorosa” homenagem ao comendador Castro Alves



Actuais e antigos alunos da Fundação Castro Alves juntaram-se para homenagear o comendador, levando a cabo um espectáculo de música, poesia e com muitas recordações à mistura, dez anos após a sua morte. Mas para o presidente do conselho de administração, Manuel Boaventura, “o facto de a fundação continuar aberta todos os dias, lutando contra ventos e mares, é efectivamente a melhor homenagem”.

Mas dúvida não tem ainda Manuel Boaventura sobre a justeza da homenagem realizada no dia 27 de Setembro último. “Reflectindo, é uma homenagem, tão justa quanto dolorosa”. E justifica: “Diogo dolorosa porque, a meu ver, não há justiça no tirar do meio de nós um homem bom como era o comendador Castro Alves. É a lei da vida, uma inevitabilidade que faz com que os homens bons tenham de sair da nossa beira”.

Escreveu José Régio: “(…) Quando me dizem: ‘vem por aqui!’ / Eu olho-os com olhos lassos, / (Há, nos olhos meus, ironias e cansaços) / E cruzo os braços, / E nunca vou por ali...” Os versos fazem parte de “Cântico Negro”, um dos mais célebres poemas de José Régio e um dos preferidos do comendador. E o programa de homenagem começou exactamente por aqui, com a leitura deste poema, por Paula Guedes, ex-aluna da fundação. “Por onde foi” Castro Alves fez dele um homem singular. Um exemplo daquilo a que o vice-presidente da Câmara Municipal de Famalicão, Leonel Rocha, designaria por “homens acima do seu tempo”. “Homens que ousam contrariar a corrente do pensadamente dominante. Chamam-lhe idealistas, utópicos, mas são eles que nos dizem que o mundo pode ser diferente, mais humano, mais justo e solidário”.

“Não sei para onde vou / - Sei que não vou por aí!”, conclui assim Régio o seu poema. Manuel Maria Castro Alves, afirmou ainda Leonel Rocha “não subordinou o seu projecto de vida ao sucesso económico e muito menos se deixou escravizar pela acumulação de riqueza. Optou por distribui-la pelos mais carentes e por a colocar ao serviço da educação pela arte”.

No âmbito de uma reportagem transmitida pela RTP em 1983, Castro Alves apontava as razões do caminho trilhado por si. “Quando mais novo não tive a possibilidade de me desenvolver culturalmente” (…) mas “fui trabalhado e lutando pela vida e hoje [1983] encontro-me com algumas facilidades, com algumas possibilidades para poder proporcionar aos outros, aos jovens de hoje, alguma das coisa que eu não tive e que gostaria de ter tido”. Palavras do comendador recordadas no passado dia 27 de Setembro no âmbito da homenagem que lhe foi prestada, depois de uma década passada sobre o seu falecimento.

Uma homenagem à qual se associaram antigos alunos que, desta forma, voltaram a pisar o palco da fundação, ora integrando a orquestra, ora o grupo de cavaquinhos ora mesmo o grupo coral, juntamente com os que todos os dias vão “abrindo” as portas do então designado Centro de Cultura e Arte Popular de Bairro. No essencial, a homenagem ao comendador repartiu-se entre a poesia e a música com momentos protagonizados por quem fez e/ou faz a história desta instituição famalicense.

“Independentemente de quem cá vai continuar no futuro”, afirmou Manuel Boaventura, o importante “é que todos colaborem mais, sejam mais solidários e percebam que a instituição que o senhor comendador deixou é efectivamente a melhor forma de expressar a homenagem permanente que ele merece”.

Leonel Rocha deixaria idêntico desafio: “a cooperação entre o município e a fundação é excelente, estendendo-se neste momento a múltiplas áreas. Vamos pensar em alargar este mesmo plano de acção, pensando e repensado o futuro da fundação, o desafio que lanço é, apresentemos projectos”. Em declarações ao Entre Margens, o vice-presidente deu conta de que a Câmara Municipal “faz chegar” todos os anos à fundação 60 mil euros, ora através de subsídios ora através da aquisição de peças da cerâmica e adiantou ainda que será feito um acordo tripartido no sentido de requalificar o edifício que apresenta vários pontos de degradação: “Está previsto para breve a realização de um acordo tripartido entre o Centro de Cultura Musical-Artave a Câmara Municipal e a própria Fundação” para “avançar com obras de reabilitação deste espaço adaptando-o de modo muito particular ao ensino da música e, num segunda fase, avançaremos para a recuperação do próprio auditório”.

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